26.9.14

1. Dezembro foi o adicionar de novas páginas a um capítulo quase findado. Foi dois corações quentes e quatro mãos frias. Não pedi um amor, mas tu chegaste-me perto do Natal com a tua simpatia e distracção. Aceitei-te. Gostaste da maneira como falo e eu gostei de ti.

2. Janeiro foi um beijo roubado. Um café na esquina. Foi um passeio de mota depois da meia noite e entrar em casa pela janela. Um crepe de chocolate e um jogo de cartas. E o toque delicado, a medo, da tua mão na minha debaixo da mesa ou no banco do carro.

3. Fevereiro foi bombons de chocolate devorados no capot de um volvo antigo de frente para o mar. Foi o francês que me ensinaste. Foi palavras bonitas. A vontade do mar e do céu em transpor a linha do horizonte e serem um só. Foi madrugadas no sofá de alguém a partilhar calor e beijinhos na testa.

4. Março foi receber o amor no correio, num envelope lacrado. Foi o adeus ao racional. O quase-meu. As cartas escritas ao som de Ella Fitzgerald e Louis Armstrong. O querer trazer-te em mim. O querer que me levasses em ti. Foi três dedos de conversa a poucos quilómetros de casa e as beatas de cigarro que beijavas antes de me beijar. Foi descobrir que a nicotina me sabia bem. Que afinal, a queria em mim.

5. Abril foi uma cama feita num estrado de amor com lençóis de ternura no meio do nada. Foi pele com pele, e poesia. Foi cuidado e paciência e um carinho tão vasto que podia curar o mundo. Abril foi amor, por amor, com amor. Foi descobrir e beijar-te os medos e os poros. Foi receber-te e aceitar-te em mim como se cá pertencesses. Corpo e coração.

6. Maio foi flores. Flores pelo campo, pelo meu vestido, pelo meu coração. Foi fim de ciclos. Foi passeios de jipe sem capota na 125 ao final da tarde. Foi álcool no sangue e tiago bettencourt ao ouvido. Foi amor numa praia deserta, de coração cheio. Foi aprender que viver com fogo na garganta é quase melhor do que viver com flores ao peito.

7. Junho foi vontades. Compreensão. Foi conhecer a fundo e descobrir defeitos. Foi aceitá-los e valorizar as qualidades. Junho foram dias mais cheios, corações meio vazios. Foi querer mais disto, de ti. 

8. Julho foi vácuo. E dias sem nós. Foi procurar-te. Esperar-te. Foi desculpar-te por uma ausência pela qual nunca te desculpaste. Julho foi perceber que se quisesses cá estar, terias vindo. Foi um coração meio cheio e outro vazio.

9. Agosto foi saudade às duas da manhã e da tarde. Foi mãos trémulas na tua ausência. Foi amor esporádico, à pressa e em cima do joelho. Foi desconforto e estranheza. Foi uma procura desesperada do frio de Abril, e a triste noção de que só o calor existia agora. E queimou. Gostar-te ardeu nesses dias de agosto.

10. Setembro foi um adeus forçado. Um outro café numa outra esquina. O último. Setembro foi roturas e despedidas feitas em silêncio. Foi mãos trémulas na tua presença - e a tua indiferença. Foi um "desculpa" que me soou vazio, e noites exaustivas na procura de restos de ti. A estética da intimidade altera-se quando no teu lugar na cama há um vazio. Já não choro. Tenho saudades, mas não me fazes falta. Quero-te, mas não preciso de ti. Co-dependência nunca nos assentou bem, nunca tivemos uma necessidade exaustiva um do outro. E é isso que dói. É saber que apesar de não precisar de ti, eu escolhia-te. Ter-te-ia escolhido uma e outra vez. Tu não passas de um aglomerado de átomos e dúvidas com um coração frio que bate às vezes e um par de olhos que me incendiaram a alma e inspiraram sonetos. Como é que me deixaste em ruínas?


Candy (2006) from Tumblr

3 comentários:

  1. Caem lágrimas como poesias de Camões, perdidas em folhas de sebentas rasgadas e amarelecidas pela chuva que teima em ficar, lágrimas como as que caíram quando vi o Candy, mas mais fortes e persistentes. Mais sentidas. Dói-me o coração, que perdi, ao saber que há alguém no mundo que sente resquícios daquilo que sinto e que guardo em dias mistos de chuva e sol, e a alma sorri por esse alguém seres tu. Vivo de amores de pedaços de papel, porque no papel a realidade não adensa, o mundo não acondiciona e nem o tempo nem o esquecimento os podem levar. Ao ler-te, sinto que o meu papel não é apenas este amontoado oco de folhas que se atropelam nas gavetas, mas a continuação de ti e de um mundo, que quero acreditar melhor. Não se onde estás, mas estás aqui. Não sei como és, mas és mais bonita assim. Não te posso abraçar, mas sei que um dia essa ideia remota, será concretizada.
    Não te posso tirar os medos. Ofereço-me para os sentir contigo. Lado a lado.

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  2. e isto, foi das coisas mais bonitas que já li.

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  3. E basta um instante nesse colo para te despires do mundo. Muito obrigada.

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