27.7.14

Ao homem que amei, e aos que quis amar:

1. Conheci-te de bolsos vazios. Tinha tanto para te dar. Agora sei - dei-te demasiado, mais do que conseguias carregar. Enchi-te os bolsos de cartas e, gosto de acreditar, o coração de amor. Deste-me sorrisos de cristal e uma tempestade de coisas novas. Começaste por ser uma chuva de verão, agradável e benéfica. Necessária. Depois o Inverno bateu-nos à porta. Tornámos-nos frios. Tornaste-te trovoada. Relâmpagos que me fizeram tremer o corpo e trovões que me tiraram o sono. Fomos felizes às vezes. Não voltei a amar depois de ti. Não sei se algum dia voltarei. Pelo menos, não dessa forma tão altruísta e auto-destrutiva. Se, como dizem, "a paixão é um sábado à noite e o amor, um domingo se manhã" gosto de pensar em nós como uma sexta-feira - aguentámos a segunda e o resto da semana. Estamos hoje num local calmo, sentamos-nos para tomar café e estamos entre amigos.

2. Cento e oitenta dias que quis que fossem nossos. Cento e oitenta dias que foram teus e de outro alguém.

3. Gostar-te foi um caos. Exaustivo. Anárquico. Foste noites perdidas e loiça partida debaixo da minha pele. Foste um breve e ténue vislumbre de um possível futuro remoto a dois - o único que tive. Ambos sabemos que o que quer que tenhamos sido, fomo-lo desde o início. No dia em que escolheste o caminho que querias para ti, enterrei parte de mim com o nosso pseudo-amor. Olhar vazio e uma atitude destrutiva que escondem um coração magoado pela vida. Garrafas vazias e mulheres que te aquecem a cama durante a noite, mas cujos nomes não te lembras de manhã. O negro funesto da vida e o azul nocivo dos teus olhos. Esses olhos arruinaram-me para sempre. Queimam-me a retina e perseguem-me nas noites em que o sono não vem. Sei que fui eu quem te falhou quando o amor nos chegou no correio. Não acreditas, mas ter-nos-íamos destruído até aos ossos. Se na minha vida houver lugar para um "se", esse lugar pertence-te. Serás sempre o meu "se". Acredito que se não o fosses, terias sido o "mas". E um "mas" não te faria justiça, não é meritórito. Tem dias que tiro folga da vida e penso humildemente em ti. Espero que estejas bem, e que tenhas quem cuide de ti.

4. A música estava tão alta que não era senão ruído. Havia confusão à nossa volta e um copo meio-cheio na tua mão esquerda. Quando me beijaste, foi cru. Tinhas os lábios frios e sabias a álcool. Só te conhecia o nome e a reputação. Tu estavas ébrio, eu não. Mas estava sozinha. Nunca tinha beijado alguém de quem não gostasse, mas deixei que me beijasses. Correspondi. Nessa noite fui para casa e não me arrependi. Antes de adormecer escrevi-te a primeira de muitas cartas. Dias depois disseste-me "contigo é diferente", mas só éramos um do outro depois de alguns copos e uma noite beijaste todas aquelas raparigas e eu não senti que comigo fosse diferente. Disseste-me "podíamos ser qualquer coisa" e nenhum de nós acreditou, mas fingimos bem. Naquela semana de Outubro partiste sem te despedires, e meu deus, doeu. Senti fogo no estômago e pensei que o amor, como a vodka, queima ao primeiro trago e meia garrafa mais tarde, estamos entorpecidos nas coisas que já esquecemos. Afoguei as borboletas perversas que me dilaceravam o estômago nas palavras de ódio de que me alimentei quando te vi dar-lhe a mão. Fui uma idiota por ti, porque nunca confiei nos teus actos e nunca houve manhãs fáceis contigo, mas quis-te tanto ainda assim. Achei que não me magoarias se não te amasse, mas doeu na mesma. Houve dias que te odiei. Não te amei, mas gostei de ti. E como.


Ao homem que espero vir a amar: 

Tenho uma playlist com o teu nome e nunca me deixei ser de ninguém como me deixo ser tua. O sabor a tabaco não me incomoda se o provar dos teus lábios. Somos uma epifania de peculiaridade, mas somos felizes à nossa maneira. Sei que, como a mim, te tiraram o único vislumbre ténue de um futuro remoto a dois que já tiveste, e que agora o medo mora ao lado. Forrei as minhas mãos de veludo e preparei-me para receber o teu coração. Não podias compreender menos esta minha necessidade de transformar sentimentos em palavras e tens os dias tão cheios que às vezes é difícil fazer espaço para mim, mas gosto tanto de ti. Há um lugar em mim que já te pertence - é uma casa pequenina a um canto do meu coração. Às vezes, em dias que a saudade aperta, sinto-a ceder. Ainda não sei se te amo, mas às vezes a casa cede.




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3 comentários:

  1. speechless, foi assim que me deixaste com isto. muito bom!

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  2. foi das coisas mais doces e, francamente, mais relatable (porque me esqueci da palavra em português, talvez por não me soar tão bem) que já li...

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  3. Para mal dos meus pecados, é o desamor que o consome. Mas não te poderei falar disso.
    Aquela notícia soube a isso mesmo, a infância e a azulejos que são agora cacos.

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